A verdade inconveniente sobre os aumentos
Das tarifas do transporte coletivo urbano[i]
Autor: Otávio Vieira da Cunha Filho[ii]
Os aumentos das tarifas do transporte coletivo urbano são simplesmente o resultado do ciclo vicioso que ocorre porque o transporte publico torna-se cada vez menos competitivo em relação ao transporte privado e atrai cada vez menos passageiros pagantes que dividem custos crescentes. Ciclo este perpetuado e negligenciado ao longos dos últimos anos. Essa é uma verdade que poucos entendem e/ou querem entender, principalmente, porque ela é ao mesmo tempo complexa e desafiadora.
A complexidade decorre das relações de interdependência entre os custos dos insumos, número de passageiros pagantes, processo de desenvolvido humano e a atratividade do modo do transporte privado. Por outro lado, o caráter desafiador refere-se à dificuldade de implantar uma política pública de longo prazo para o transporte coletivo urbano . Obviamente, essa situação gera um reflexo direto sobre os valores das tarifas, pois os operados do transporte coletivo urbano têm que alcançar o equilíbrio econômico-financeiro para manter os serviços ofertados à população.
Em termos práticos, existem diversos indicadores que demonstram a existência, perpetuação e negligência em relação a esse ciclo vicioso. Segundo levantamento da NTU, realizado em 2012, nos últimos 17 anos a tarifa média nacional ponderada aumentou 36%. Diversos fatores contribuíram para esse aumento, entre eles, a redução de mais de 25% da quantidade de passageiros transportados; o nível de gratuidades, que alcançou média nacional de 25% dos passageiros; e, a incidência de carga tributária de 22% do valor da tarifa. Paradoxalmente, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revela que os subsídios diretos ao transporte individual são 11 vezes maiores do que aqueles concedidos ao transporte público urbano.
Infelizmente, essa verdade inconveniente e os fatos que demonstram o ciclo vicioso são colocados em segundo plano no debate com a sociedade. Frequentemente, o foco é o índice de reajuste da tarifa, que é sempre questionado e considerado injusto, pois contribui para o aumento dos custos de deslocamentos das famílias brasileiras. Conforme foi amplamente noticiado pela imprensa, a Presidenta Dilma Rousseff solicitou aos prefeitos de São Paulo e do Rio de Janeiro que os aumentos sãs tarifas não fossem realizados, pois contribuíram significativamente para o impacto inflacionário indesejado.
Assim como Al Gore, que apontou para a necessidade de encarar as evidências do aquecimento global e as consequências potencialmente devastadoras, a verdade inconveniente sobre os aumentos das tarifas dos ônibus precisa ser enfrentada sem hipocrisia. Enquanto não estivermos dispostos a criar um ciclo virtuoso para o transporte coletivo urbano, estaremos tropeçando nos aumentos da tarifa e em reclamações de todas as partes. A criação de um ciclo virtuoso depende diretamente da priorização do transporte público associada a políticas de redução de impostos e tributos incidentes sobre a tarifa.
[i] Artigo publicado originalmente na Revista NTU Urbano. Ano 1, Nº 1, p. 6.
[ii] Otávio Cunha é presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU)
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